"Teu ato mais sublime é colocar outro em sua frente." William Blake

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Tempo

Rente à casa da minha infância
corria um rio.
A casa era de madeira e vida a escorrer,
o rio não sei de que era.
Saía de mãos dadas à alma que não era minha
e observava-me a correr no campo.
As flores lançavam-me perfumes de outros tempos,
balançando-me em músicas antigas
que ninfas divertidas insistiam em cantar.

Sempre que voltava à casinha da minha infância
não era a ela que voltava,
pois já não estava lá.
Havia sempre só o rio
a se fingir a passear.
Eu o seguia, como se segue uma vida sem propósitos,
e encontrava um porto, uma caverna, uma gruta...
E fazia o que quer que achasse de casinha,
e fazia dos meus muitos anos a minha infância.
E assim fui sendo,
caçador de sonhos que fazia meus,
perdendo a cada dia a esperança de ser outro.
Só o rio continuava,
deus úmido indiferente à minha passagem.

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