"Dormi e acordei sob a impressão de estranho mal-estar; sentimento de um destino obscuro e truncado. Responsabilidade em destinos alheios, sensação de culpa e de total incapacidade para erguer a vida a um nível sereno e justo. (Este nível sereno, justo - realmente, fundamentalmente eu o desejei alguma vez na minha vida?). Profundeza de certas impressões - como uma aura que circulasse no mais íntimo do ser - e que não se constituíram ainda em sentimento firme. Agitamo-nos no sono ou semi-acordados - e as vagas se sucedem sobre nós, arrastando os secretos detritos que povoam nosso inconsciente, a vida nas trevas da alma, o que em última análise deve constituir nosso supremo movimento diante da morte: o medo incaracterizado do animal, palpitando às expensas da consciência, crivado de raios escarlates de remorso e pressentimento, como veios súbitos riscando o cerne escuro das pedras."
Lúcio Cardoso, Diário.
Lúcio Cardoso, Diário.
Nenhum comentário:
Postar um comentário